sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Vida de Fernando Ferrari

FERNANDO FERRARI (1921/1963)

Gaúcho de nascimento, diplomou-se em economia pela PUC do Rio Grande do Sul, fixando residência no Rio de Janeiro, onde passou a trabalhar no Serviço de Alimentação da Previdência Social. Verificando ter sido institucionalizada a corrupção no aludido órgão público, denunciou-a à imprensa, iniciativa que se fez acompanhar de pedido de demissão. Estávamos em 1946 e Fernando Ferrari completava 25 anos de idade.
Regressa a Porto Alegre, ingressa no Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e, nesse início de atividade política, torna-se deputado estadual. Na eleição de 1950, concorre a uma cadeira na Câmara dos Deputados. Bem sucedido, reelege-se em 1958. Torna-se líder da bancada trabalhista.
Naquela altura, o PTB aparecia como uma espécie de terceira força partidária. De um lado o que seria expressão do conservadorismo liberal, o Partido Social Democrático (PSD) e, de outro, a organização que pretendia ocupar o espaço autenticamente liberal, a União Democrática Nacional (UDN). Estaria predestinado a estruturar a corrente socialista de índole democrática, com a vantagem de achar-se vinculado ao movimento sindical, base de apoio com a qual não contava a agremiação que se propunha essa missão, o Partido Socialista Brasileiro (PSB), que jamais deixara de constituir uma facção estritamente intelectual.
Acontece que o PTB associara-se ao peleguismo sindical, às mais nefandas tradições do patrimonialismo brasileiro, vinculando-o em definitivo à corrupção. É certo que essa agremiação abrigava personalidades de expressão nacional, como Alberto Pasqualini, que tinham clareza quanto à feição de que se deveria revestir trabalhismo autêntico. Contudo, não se dispunham a enfrentar a cúpula dirigente, em razão do que a sua pregação aparecia como algo dissociado da realidade nacional.
Fernando Ferrari rompe com aquela espécie de conformismo. Dispõe-se a lutar pelo arejamento da agremiação, contra o que denunciava como “estrutura unipessoal do poder decisório”. Considerando que o arcabouço ideológico, do que deveria ser um partido trabalhista, achava-se formulado (Pasqualini), entendeu que
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o elo aglutinador, capaz de proporcionar uma reviravolta no PTB, seria o combate à corrupção.
A oportunidade de dar dimensão nacional a tal movimento ocorreria nas iniciativas destinadas a preparar a campanha eleitoral de 1959. Grupo de estudantes do município gaúcho de Santa Maria divulga um manifesto com a sugestão de que concorra àquele pleito como candidato à Vice-Presidência. Essa candidatura, segundo os autores do documento, permitiria “uma cruzada cívica de mãos limpas”, como reação às acusações de corrupção, cada vez mais freqüentes e mais amplas, contra petebistas detentores de cargos públicos. Decide-se Ferrari por atribuir dimensão nacional a tal movimento. Lança então o que denominou de “Campanha das Mãos Limpas”. Ao invés, como supunha, do slogan transformar-se numa bandeira da agremiação, para retirar-lhe a pecha de corrupta, já que não podia ser aplicada à generalidade de seus membros, viria a constituir uma batalha interna. Acontece que, nesta, não tinha maiores condições de êxito, não só dado à convulsão a que seria arrastado o país, nos exercícios seguintes, tendo ao líder do PTB (João Goulart) como principal pivô, como igualmente à morte prematura do autor.
Esclareça-se que Ferrari evitou atribuir cunho pessoal à sua campanha. Ney Figueiredo incluiu a Getúlio Vargas e Leonel Brizola num estudo que patrocinou sobre o inventário de homens públicos do período recente (Políticos ao entardecer, 2006) e atesta não ter ficado provado que se tivessem beneficiado de sua passagem pelo poder para aumentar o seu patrimônio pessoal. Ambos eram ricos, do mesmo modo que João Goulart. A questão é que, basicamente a partir de Goulart, tolerou-se a prática da corrupção em órgãos públicos, naquele período circunscrita à Previdência Social. Mais tarde, com o agigantamento do Estado e a estatização da economia é que iria tornar-se verdadeira praxe (ou praga).
Entre junho de 1959 e maio de 1963, cerca de quatro anos, Ferrari é instado a criar o que batizou de Movimento Trabalhista Renovador (MTR). Primeiro no interior do PTB e, a partir de 1960, como agremiação política autônoma.
Em junho de 1959, um grupo de deputados sugere que renuncie à liderança da bancada. A alegação seria a de que, pretendendo candidatar-se à Vice-Presidência, a pretensão seria incompatível com a função. Tendo se recusado a fazê-lo, foi destituído. Na verdade, o que incomodava a cúpula certamente não era a pretensão de vir a ser candidato a cargo mais alto mas o tipo de pregação a que se dedicava. Dispondo do controle dos votos de qualquer convenção nacional, o grupo de Goulart bloquearia tranquilamente aquela pretensão. Incomodava-o o holofote sobre o comportamento dos trabalhistas no exercício de funções públicas.
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Em que pese essa primeira demonstração do que o esperava, Fernando Ferrari não desistiu de atrair parte do PTB para a sua plataforma. Nessa expectativa disputará na Convenção Nacional do ano seguinte a indicação do seu partido para figurar na chapa da eleição presidencial na posição de Vice. A deliberação oficial era a de que a agremiação teria candidato próprio à Presidência, João Goulart. Quando da Convenção, o partido iria optar pela adesão à candidatura do PSD (general Henrique Lott, ex- Ministro da Guerra), chapa na qual Goulart figuraria como Vice. Como se sabe, seria daquelas eleições (outubro de 1960), que sairiam vitoriosos, para a Presidência, o candidato da UDN (Jânio Quadros) e para a Vice, o postulante da chapa concorrente, PSD/PTB (João Goulart).
No próprio evento acima referido, consuma-se a expulsão de Ferrari do PTB.
Concorrerá à Vice-Presidência na legenda do Partido Democrata Cristão que, para a Presidência, apoiava a candidatura de Jânio Quadros. Apesar de ter tido uma votação expressiva, ficou em terceiro lugar, sendo Milton Campos (UDN) o segundo colocado.
Tendo se tornado uma figura nacional e o MTR conquistado diversas adesões, na condição de movimento cívico apartidário, reunido em convenção, logo depois das eleições, decide transformar-se em partido político, ainda em 1960.
Na crise da posse de João Goulart (agosto/setembro, 1961), agora na condição de líder do MTR, Ferrari manifesta-se claramente em favor de sua posse. Recusa-se contudo a apoiar a adoção do parlamentarismo. Embora considere que essa forma de governo convinha plenamente à nação --que entendia achar-se “cansada de um presidencialismo prepotente, personalista”--, recusava contudo a sua adoção da forma como veio a ser introduzida.
Nas eleições para renovação dos governos estaduais (outubro, 1962), disputa o posto no seu estado natal, sendo derrotado. Faleceria poucos meses depois, em maio de 1963, vítima de desastre aéreo ocorrido no Rio Grande do Sul.
O conjunto de suas propostas reuniu-as em livro (Novos rumos do trabalhismo).

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